Dono da bola: os desafios de Richard Dubois à frente da Arena BSB
A pandemia do novo coronavírus apenas adiou os planos da administradora do Complexo Esportivo e da Torre Digital para fazer de Brasília um polo de esporte, entretenimento e lazer
Candangos foram aqueles que vieram colocar a mão na massa na época da construção de Brasília. Mas uma cidade que acaba de chegar na chamada melhor idade ainda tem muito que crescer e se desenvolver. E, para isso, continua contando com a dedicação de brasileiros que deixam suas cidades natais e não medem esforços para arregaçar as mangas e ajudar Brasília a crescer.
Não foi diferente com Richard Dubois. O paulistano chegou definitivamente por aqui há dois anos. A capital já era destino frequente há uma década por conta do trabalho. Especialmente nas vésperas da Copa do Mundo de 2014, quando a empresa em que ele trabalhava assumiu a operação não esportiva do torneio. “Foi um projeto memorável. Por conta das manifestações pré-evento, a Fifa ameaçou tirar a Copa do Mundo do Brasil. Então, fomos contratos para fazer a gestão. Tínhamos um escritório ali no Brasil 21 e, da janela, eu via diariamente o Mané Garrincha”, lembra.
Enxergou um potencial no chamado “elefante branco” e projetou um uso mais proveitoso para o estádio. O namoro começou na época do governador Agnelo Queiroz, passou pela gestão de Rodrigo Rollemberg e desenrolou para o atual governo de Ibaneis Rocha. “Quando Ibaneis assumiu que conseguimos prosseguir com as negociações. Ele deu energia e o foco necessários para chutar a bola para dentro do gol e destravar os últimos empecilhos. Com isso, na metade do ano passado assinamos o contrato de concessão e, em janeiro, a transferência definitiva da operação para a
Arena BSB por 35 anos”, conta o diretor-presidente, que recebeu do GDF a concessão para usar e investir no
Complexo Esportivo que engloba o Mané Garrincha, o Ginásio Nilson Nelson e o Complexo Aquático Cláudio Coutinho.
Dubois é paulistano de nascimento, mas carrega esse nome por conta da família de origem francesa. “Desde pequeno visitei a França. Mas na hora de torcer entre o Brasil e a França, eu torço pelo Brasil. Já briguei muito com meu pai por causa disso, inclusive na final daquela copa que perdemos para os franceses”, brinca. Engenheiro de formação, iniciou a carreira profissional no mercado financeiro, com passagem por multinacionais e bancos, além de experiências nos Estados Unidos e na Europa.
Mais do que vislumbrar o crescimento dos seus negócios,
é nítido em Dubois a vontade de fazer Brasília crescer. O investimento é ousado e grandioso. Os planos são muitos. À frente do negócio, os primeiros eventos realizados pela Arena BSB neste ano foram um grande evento religioso, a final da Super Copa do Brasil, com jogo entre Flamengo e Atlético-PR, e o show do Maroon 5.
[/b]Pegos de surpresa pela pandemia do novo coronavírus[/b], a programação dos próximos meses foi adiada – [/b]o show da banda Kiss já foi remarcado para o dia 10 de novembro[/b]. Como apoio ao combate à pandemia, parte do estádio foi cedida ao Governo do Distrito Federal como uma ação social e hoje funciona como hospital de campanha e recebe pacientes em tratamento da Covid-19, sob administração da Secretaria de Saúde do Distrito Federal.
Mas a expectativa é que tudo volte ao normal o quanto antes para que o projeto siga sendo colocado em prática. “
Teremos eventos esportivos, religiosos, culturais, educacionais. Será um pouco de tudo para mostrar o potencial de Brasília e gerar muitos empregos”, acredita. Com isso, o diretor-presidente espera, principalmente, mudar a imagem que se tem em relação ao estádio. “Vai ser um elefante branco que sabe dançar, sambar, cantar”, brinca. Confira a entrevista.
O potencial da capital
“Brasília tem empresários fantásticos em qualidade, mas poucos em quantidade. Isso é uma das coisas que nos motiva a buscar mais oportunidades aqui. Há muita coisa boa sendo feita, mas a cidade está crescendo, acho que cabe mais ideias, e a gente veio para somar e compor. Com as nossas iniciativas, vamos gerar empregos, diversão e agregar com o crescimento de Brasília.”
Público x privado
“A ideia foi juntar a visão de Lucio Costa – de que Brasília precisava de uma área de entretenimento e lazer ali no Eixo Monumental – e a experiência internacional de que todas as grandes arenas têm ao seu redor uma área de entretenimento, com uma vontade do governo de passar a gestão para um privado. Para realizar um show, por exemplo, é preciso negociar com o bar, o estacionamento, os direitos de publicidade… É uma negociação complexa. O governo não consegue fazer, tem uma tabela muito inflexível, o servidor não tem autonomia. Tem que prestar muita conta e é mais fácil não fazer. Conosco, a gente tem mais liberdade. A autonomia de decisão é muito maior.”
Um elefante branco?
“Brasília ainda não tem um time de futebol forte. O estádio ficou subutilizado. Ele é maravilhoso, uma localização única. Pouquíssimas cidades do mundo têm um estádio numa região tão central, com uma área de expansão tão grande em volta. E foi mal aproveitado, largado, judiado. A gente viu uma oportunidade de negócios. Ele é um patinho feito que nasceu com uma série de problemas. Mas agora ele está ali no centro da nossa cidade e a gente não pode ficar culpando quem fez o parto, nem chorando e nem lamentando. A gente tem que adotá-lo. Vai ser um elefante branco que sabe dançar, sambar e cantar.”
Investimento no estádio
“Encontramos o estádio em uma situação que havia a necessidade de um investimento imediato de R$ 22 milhões em infraestrutura básica. Desde trocar torneira do banheiro, iluminação, consertar vazamento, problemas na cobertura, portas quebradas, até na automação e sistema de segurança. Aí você pensa que é uma obra muito recente, né? Mas era muito mal tratada. Não é culpa de ninguém, mas era um sistema que não funcionava. Cada produtor que entrava, mexia do jeito que queria e largava. Não tinha fiscalização, não tinha cobrança… A equipe era muito pequena. Nós estamos aumentando em dez vezes a equipe que cuidava do estádio.”
Mudar o nome?
“Todo grande estádio na Europa e nos Estados Unidos tem naming rights, que é quando recebe o nome de uma empresa que investe no local. Como a arena em São Paulo, que se chama Allianz Parque. Então, não seria mudar, seria acrescentar. É algo comum, corriqueiro. A gente não quer apagar a imagem do Mané Garrincha, que foi um jogador maravilhoso. Queremos celebrá-lo como atleta. Como uma área de negócios, a gente está procurando uma marca que queira se associar ao estádio.”
Nos arredores
“Fora da arena, nós vamos construir um boulevard, que a gente acha que vai revolucionar Brasília. Vai ter cinemas, restaurantes, teatro… Será onde o brasiliense vai encontrar entretenimento e lazer. Brasília está cada vez mais cosmopolita e, para isso, tem que ter seu bairro boêmio. A gente brinca que quer pegar um pouco da Vila Madalena de São Paulo, da Lapa do Rio, da Broadway, da Champs Elysee de Paris, do Porto Madero de Buenos Aires, bater no liquidificador com um pouquinho de pequi para dar o nosso sabor local e ter uma área onde o brasiliense possa curtir. O investimento total será de R$ 500 milhões.
Já fechamos negócio com o Cinépolis, teremos o segundo maior complexo de cinemas de todas as marcas aqui no Brasil. E ainda 30 restaurantes, duas casas noturnas, academias, mercado gourmet. A expectativa é de iniciar as obras até o fim do ano – que devem gerar uns quatro mil empregos – e ficar pronto em 2022.”
Demolir o Nilson Nelson?
“O diagnóstico hoje é: nós precisamos de um ginásio de primeiro mundo. A capital não pode ter um ginásio que não tenha ar-condicionado, camarotes, infraestrutura para o atleta, o artista e o público. A acústica é ruim, tem goteira. Uma série de problemas. É um prédio que foi construído nos anos 70 e não está atual para 2020. Atualizá-lo não significa destruir história, significa que não atende mais a necessidade. Então, vamos construir um novo estádio. Estamos olhando com muito carinho para manter a estrutura física como uma área secundária. Se nossos times de futebol ainda estão um pouquinho para trás, no basquete e no vôlei a gente está na primeira liga e queremos ter uma casa adequada. Vamos tentar não demoli-lo. Estamos estudando ainda.”
Complexo aquático
“A gente acredita que a concessão é uma parceria com a sociedade. No complexo aquático, se fôssemos cobrar pelo serviço, isso afastaria as famílias que o utilizam. Então, a decisão é que será uma contrapartida social. Faremos a manutenção predial e o serviço continuará gratuito ou com uma taxa simbólica.”
Outros projetos
“
Aqui em Brasília, nós já ganhamos a licitação da Torre Digital, em estudo. Estávamos disputando a licitação do autódromo, mas o governador quer fazer algo maior e a nossa proposta é um autódromo economicamente viável. Então, o governador decidiu uma outra linha. Se voltar a licitação, estamos na poli position, esperando a largada para disputar. Aqui em Brasília também temos a proposta para administrar o metrô. Fora daqui, ganhamos a licitação do Parque Olímpico, no Rio de Janeiro, e disputamos Interlagos, em SP, mas decidimos não apresentar a proposta porque economicamente não era viável. Estamos disputando a concessão do Maracanã. A gente acredita que essa área de concessões e PPPs vai crescer muito no Brasil.”
Brasília, 60 anos
“Brasília está passando por uma mudança e os 60 anos são uma fase de reflexão. Se me permitir uma opinião, Brasília tem que deixar de ser uma cidade que vive da política e do governo para ser uma cidade que vive por si mesma. É a capital da República, sim, mas pode ser a capital do entretenimento, do lazer. Temos uma malha aérea a nosso favor, grande capacidade logística de hotéis, podemos trazer grandes shows e eventos. Podemos e devemos desenvolver a questão do polo tecnológico, aproveitando toda essa molecada que está saindo das universidades e que não vai encontrar emprego no setor público. É hora de entender que o crescimento de Brasília virá de empregos do setor privado e acho que essa conscientização chega com a transição dos 60 anos. Será esse marco de virar a página e ver a maturidade econômica de Brasília.”
*Publicado originalmente na revista GPS 26 – Especial Brasília 60 anos
Fonte:
https://gpslifetime.com.br/conteudo/...e-da-arena-bsb