Será que dessa vez teremos uma renovação hoteleira em Brasília?
Mudança de foco e crescimento crescente. Veja o que diz Abel Castro sobre a Accor
Com o posto de vice-presidente sênior de Desenvolvimento na Accor para a América do Sul, Abel Castro computa mais de 20 anos de experiência na indústria hoteleira. Principal responsável atualmente por definir e implementar estratégias de expansão para todas as 38 marcas da companhia, antes de ingressar na rede francesa, desempenhou diferentes funções nas áreas operacionais de hotéis independentes. Trabalhou como consultor na BSH International, em São Paulo, e atuou como diretor-executivo do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil (FOHB), entidade que reúne as principais redes do Brasil. Sua formação inclui o General Management Program, na The Wharton School da University of Pennsylvania (EUA) e MBA em Marketing pela ESPM-SP, além de ser graduado em Turismo e Hotelaria pela UNIVALI-SC. Concluiu, ainda, cursos de extensão sobre Gestão Hoteleira e Turismo em Sydney, na Austrália; e em Palma de Mallorca, na Espanha. Na área acadêmica, lecionou na graduação e pós-graduação dos cursos de hotelaria nas principais universidades brasileiras, como Senac-SP, Anhembi Morumbi-SP e UNIVALI, além de ser professor convidado da FGV-SP.
REVISTA HOTELNEWS: Como se dá a presença da Accor na América do Sul e no Brasil?
ABEL CASTRO: A Accor mantém hoje 384 hotéis na América do Sul, sendo 316 no Brasil. Entre contratos assinados e já em construção (pipeline), são mais 108 na região, sendo 71 no Brasil. O que o Patrick Mendes determinou quando assumiu como CEO da Accor para a América do Sul, há quatro anos, foi que deveríamos chegar em 2020 com 500 unidades na região. Já estamos com 492, um ano antes do prazo terminar. Em função disso, ele estabeleceu uma nova meta a ser atingida até 2023: chegarmos à marca de 650 hotéis.
RH: A Accor tem mais de 40 anos de operações no Brasil, quase 13 estão sob sua gestão. Quais foram os principais desafios no início da sua carreira na rede e quais são os de agora?
AC: Os desafios são muito parecidos, tanto no início quanto agora. O maior deles sempre foi encontrar os melhores parceiros para desenvolver os melhores hotéis, nas melhores regiões. O Brasil é um país complexo. Não há linhas adequadas de financiamento, as crises fazem parte da nossa vida, há muitas pessoas com boas ideias, mas com pouca capacidade de realização de negócios. Quando cheguei aqui haviam apenas 100 hotéis no país e hoje estamos alcançando 500. Isto faz com que o nosso discurso de vendas das marcas atualmente seja menos complicado do que no passado. Além disso, temos uma série de parceiros históricos, como Setin, Átrio e HSI, que continuam desenvolvendo hotéis conosco. 50% das nossas unidades são no formato de parcerias,
RH: Os mercados secundários e terciários estão no radar da Accor já há alguns anos. O caminho ainda é esse ou o foco agora é converter hotéis independentes com localização privilegiada (em grandes centros)?
AC: A Accor sempre foi conhecida globalmente por operar hotéis midscale e econômicos, e no Brasil da mesma forma, a nossa força sempre foi a Família ibis, o Novotel e o Mercure. E isso representava 80% do resultado da Accor globalmente. Nos últimos anos, com a chegada do Sebastien Bazin (presidente e CEO mundial da rede) isso mudou totalmente. Hoje, 60% do nosso faturamento vem das marcas de luxo. Ocorreu uma transformação importante no modelo de negócios da empresa.
Continuamos a crescer nesse processo de interiorização, porque o Brasil foi para o interior e nós também fomos, mas estamos estudando grandes projetos em capitais, como São Paulo e Brasília. Atualmente, nossa dedicação maior é no segmento de grandes projetos de luxo e upscale. Para se ter uma ideia, a maioria dos hotéis da Atton (Chile), que adquirimos no ano passado, foi transformada em Pullman. Já são nove unidades na América do Sul. A chegada da Fairmont no Brasil mostra este posicionamento da Accor, que absorveu investimento de mais de
R$ 250 milhões. Continuaremos nos dois caminhos: desenvolvimento do zero e conversões.
HN: Quantas marcas a Accor possui no Brasil atualmente? Há projeto de se lançar mais alguma bandeira nos próximos anos? Qual a motivação para essa segmentação tão ampla?
AC: Temos 12 marcas no Brasil. Nos últimos anos compramos diversas companhias espalhadas pelo mundo. Quando adquirimos uma marca, não visamos somente um nome, e sim um conceito, database, loyalty, clientes. Tudo isso vem no pacote, uma estrutura que ajuda e agrega nossa plataforma. Hoje, contamos com 38 marcas no grupo, mas algumas delas são muito regionais e não devem expandir para outras praças. Um exemplo é a Greet, que lançamos recentemente e é específica para a Europa. Queremos ter mais seis ou sete bandeiras, uma delas que vai chegar em breve é a Joe & Joe, nossa marca de hostel, que chamamos de open house, uma casa aberta. Esse será um investimento da Accor no Largo do Boticário (RJ).
RH: Acredita que o segmento luxo tem espaço no País? Existem planos de expansão nesse nicho com outras bandeiras do grupo?
AC: Claro que sim! O grande obstáculo é a falta de financiamentos adequados para fomentar esse tipo de empreendimento. Por isso, os novos projetos normalmente vêm atrelados ao desenvolvimento de branded residences, onde você tem apartamentos que são vendidos ao mercado e que ostentam uma marca hoteleira. E essa é uma forma inteligente de desenvolver o produto, até pela falta de financiamento. Temos cidades como Rio de Janeiro e São Paulo que recebem e vão receber o maior número de hotéis desse segmento. Alguns mercados de lazer, como Trancoso, na Bahia; e Punta de Leste, no Uruguai, também podem ter uma marca de luxo. Além das bandeiras Fairmont e Sofitel, acreditamos que há potencial para a Raffles e para marcas lifestyle, como a SLS e Delano - no segmento luxo -, e os quatro estrelas, Mondrian e Hyde. Esses em praças como Porto Alegre, Salvador e Florianópolis.
RH: Fale um pouco mais sobre os projetos de hotelaria atrelados ao residencial, é uma tendência?
AC: Hoje, 80% dos desenvolvimentos da Accor no mercado de luxo têm um componente residencial no hotel. E quando você vai para uma marca lifestyle, como SLS e Delano, é 100%. Fator que contribui muito no financiamento do projeto, quando você tem os famosos branded residences. Não é mais uma tendência, e sim uma realidade.
Já estamos estudando algumas possibilidades em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. É possível aumentar a qualidade e nível dos amenities oferecidos, por exemplo. É viável ter uma piscina muito maior, uma academia melhor equipada, um spa de grife. O comprador pode optar pelo pacote de Furniture, Fixtures and Equipment (FF&E), que inclui móveis e decoração, para participar do Rental Program, que coloca o apartamento dentro de um pool de locação.
RH: Acredita que o brasileiro tem buscado mais experiências nos hotéis, decorações diferenciadas ou o preço ainda é o grande atrativo?
AC: O preço é e será um fator de muita influência na decisão de onde se hospedar. Outro aspecto muito relevante é a localização. No TripAdvisor, uma das melhores notas em nossos hotéis é a localização. Sem dúvida, cada vez mais um diferencial que estamos trabalhando é criar experiências para o cliente, que tem muito a ver com decoração e design, setor liderado na Accor na América do Sul por Paulo Mancio. Ele vem se dedicando muito em agregar o que há de mais interessante em design no mundo para nossos produtos, em todos os segmentos. Além disso, investimos em Alimentos & Bebidas, criando novos conceitos de restaurantes.
RH: A bandeira Styles incorporou quantas unidades ao seu portfólio no Brasil? Qual o principal argumento para convencer os investidores de que trata-se de um bom negócio, apesar de demandar mais investimento em remodelação?
AC: A ibis Style veio para ficar e crescer rapidamente em todo o mundo. O grande diferencial da marca é sua capacidade de adaptar os hotéis existentes. Por isso, a maioria dos ibis Style são conversões. Hoje totalizam 43 em operação no Brasil e mais 16 em desenvolvimento. Vou dar um exemplo do porquê da marca ser muito interessante: a HSI (um private equity brasileiro com recursos do exterior) tinha uma plataforma com 17 hotéis com marcas regionais (Zii e Arco). Propusemos a troca delas por ibis Style e, como eram hotéis em cidades secundárias e terciárias, não tínhamos interesse em operar diretamente, mas trouxemos um parceiro que administra nossas franquias. Então, foi um acordo de três partes: a Accor levando a marca, know-how e expertise; o parceiro (Átrio) que opera regionalmente com baixos custos; e a HSI como investidor e proprietário dos hotéis. Eles desmobilizaram toda a operação, passaram tudo para a Átrio e se beneficiaram da nossa plataforma de distribuição global, além do acesso à nossa central de compras, que negocia para 55 mil quartos. Os hotéis já estão com um ano de operação Accor e a performance melhorou consideravelmente.
RH: A terceira onda dos condotéis acabou ou ainda existem perspectivas para esse modelo de negócio? A culpada foi a regulamentação da Comissão de Valores Imobiliários (CVM) ou das construtoras/incorporadoras que degastaram o modelo?
AC: O que mais impactou o desenvolvimento de condotel, nos últimos três anos, não foi a CVM e nem as construtoras e incorporadoras. O grande problema foi o mercado, tivemos a maior crise da história do país, que atingiu tanto os hotéis como as incorporadoras e construtoras. E esta crise foi especialmente dura para o mercado imobiliário, os lançamentos diminuíram drasticamente. Essa conjuntura teve impacto muito forte no desenvolvimento do condotel. Não sei se haverá uma nova onda desse modelo, mas o mercado imobiliário e os hotéis estão se recuperando fortemente. Nossa receita aumentou 25% de um ano para o outro. Atrelado a isso, temos uma baixa da taxa de juros que os brasileiros não sabem como funciona. Nunca tivemos uma taxa de juros de 5.5%. Com todos esses fatores, se houver uma nova onda de desenvolvimento de condotel não será uma grande surpresa.
RH: O mercado está de olho no segmento de multipropriedades. A Accor possui interesse neste modelo?
AC: A multipropriedade é o assunto da pauta, a maior parte do desenvolvimento dos últimos anos de greenfield foi feito através de multipropriedade, é um tema que acompanhamos muito de perto. Temos uma relação muito próxima com vários players e desenvolvedores desse segmento. Continuamos estudando e avaliando, mas até hoje não temos nada. Um developer ter uma marca como a Accor para vender é como um sonho. Ele vende o que está implícito, uma série de benefícios. Em resumo, a multipropriedade é um modelo interessante, porém com muitos atores ainda amadores e, se formos avançar, será depois de muito estudo.
RH: Existem planos para o desenvolvimento de resorts operados por alguma bandeira Accor por aqui? Porque hotéis de lazer não são foco da rede?
AC: Isso tem a ver com o posicionamento global da marca, que sempre buscou e se dedicou muito mais aos hotéis corporativos de cidade do que aos hotéis de lazer (resorts), porém isso vem mudando nos últimos anos. Compramos uma participação na
Banyan Tree, especialista em resorts pequenos de luxo, adquirimos também a rede Rixo, com sede em Istambul, que se dedica a propriedades
all-inclusive upscale e luxo na Europa. Então, hoje estamos desenvolvendo muito mais resorts pelo mundo do que no passado. E no Brasil é a mesma coisa, lançamos o Novotel Itu há um ano, hotel que consegue atender corporativo e lazer. Trazer um Banyan Tree para o Brasil é uma realidade.
RH: Você atuou no FOHB como diretor executivo, em 2005 e 2006. Como analisa o papel do Fórum e das outras entidades do segmento, como as ABIHs e a FBHA? Quais os desafios dos representantes da hotelaria no Brasil?
AC: O grande desafio das entidades de classe da hotelaria é a fragmentação do setor. Com muitos hotéis espalhados pelo país, a representatividade acaba sendo muito complexa, porque há todos os tipos de investidores e de hotéis. Esse é o grande desafio, conseguir ter algumas bandeiras para você levantar e realmente brigar por elas.
RH: Com o porte e a representatividade que a Accor tem hoje no cenário turístico nacional, não é o momento de cobrar mais enfaticamente por políticas públicas mais efetivas que gerem fluxo turístico real e que movimentem o mercado de forma sustentável?
AC: Com a nossa marca podemos fazer o que está no nosso core business, que é melhorar a qualidade dos hotéis. Cada um tem sua responsabilidade neste desenvolvimento. Temos feito a nossa parte há 40 anos, que é entregar aos hóspedes empreendimentos de qualidade. O Fairmont Rio de Janeiro é um grande exemplo da recuperação de um produto que já estava desgastado, onde investimos R$ 250 milhões. Uma marca como essa também atrai turistas diferenciados para o destino.
RH: A Accor lançou um novo programa de fidelidade ALL - Accor Live Limits. Fale um pouco mais sobre ele.
AC: O ALL é uma evolução do Le Club e vai ser lançado oficialmente em novembro. Queremos que seja um ecossistema mais forte e mais poderoso do que um simples programa de fidelidade, muito além de uma troca de pontos por hospedagem. Vamos desenvolver parcerias e eventos que o dinheiro não pode comprar. Por exemplo, experiências em nosso camarote em eventos, como no Carnaval no Sambódromo no Rio de Janeiro e no Rock in Rio, que podem ser trocados por pontos. Os restaurantes dos hotéis também participam tanto para acumular quanto para resgatar pontos. A grande questão era como tornar essa marca conhecida e como seria o plano de marketing. E a resposta veio com o patrocínio do Paris St. Germain (PSG), com um contrato de três anos, onde já estamos estampando a ALL na camisa dos jogadores como o principal patrocinador. O PSG é um clube muito influente e o brasileiro é o que mais compra na loja do clube em Paris.
Fonte:
http://www.revistahotelnews.com.br/p..._noticia=10151